Sinopse
A peça Felizmente Há Luar, de Luís de Sttau Monteiro (1926 – 1993) é um drama narrativo de carácter épico, que se baseia na tentativa frustrada de revolta liberal em 1817, supostamente encabeçada por Gomes Freire de Andrade. Após a Revolução francesa de 1789 e as invasões napoleónicas, Portugal fica indeciso entre os aliados e os franceses. Para evitar render-se, D. João V foge para o Brasil. Entretanto, após a 1ª invasão napoleónica, a corte portuguesa pede a Inglaterra um oficial para reorganizar o exército: o General Beresford.
Em dois actos, são recriados os acontecimentos históricos que em Outubro de 1817 levaram à prisão e ao enforcamento de Gomes Freire pelo regime de Beresford, com o apoio da Igreja. São apresentadas as condições da sociedade portuguesa do Século XIX e a revolta dos mais esclarecidos, muitas vezes organizados em sociedades secretas.
A peça segue a linha de Brecht e mostra o mundo e o homem em constante transformação; mostra a preocupação com o homem e o seu destino, a luta contra a miséria e a alienação e a denúncia da ausência de moral; alerta para a necessidade de uma sociedade solidária que permita a verdadeira realização do homem.
Este texto é também uma metáfora política pois, apesar de a acção estar relacionada com um facto preciso e histórico, o seu principal objectivo seria retratar a situação de Portugal durante o Estado Novo. Nele vê-se a ditadura de Salazar e a perseguição do seu mais visível opositor, o General Humberto Delgado.
Felizmente Há Luar não foi oficialmente proibida pela censura, mas foi retirada das livrarias e a sua representação não foi permitida até 1974. A peça foi levada à cena pela primeira vez em Paris em 1969. Só em 1978 foi apresentada em Portugal, no Teatro Nacional, numa encenação do próprio Sttau Monteiro.
Referências:
Ficha Técnica
Texto: Felizmente Há Luar de Luís de Sttau Monteiro
(Adaptação do Grupo de Teatro O Moniz – Carlos Varela)
Encenação: Grupo de Teatro O Moniz – Carlos Varela
Cenografia: Grupo de Teatro O Moniz – Carlos Varela (Mestre Ramiro)
Figurinos: Grupo de Teatro O Moniz – Carlos Varela
(Alguns figurinos do Teatro Experimental do Funchal – TEF)
Adereços: Grupo de Teatro O Moniz – Carlos Varela
Caracterização: Carolina Camacho
Coordenação: Fernanda Freitas
Personagens/Actores
Manuel – Francisco Faria
Rita – Diana Caires
1º Popular – Sara Gouveia
2º Popular – Neide Aguiar
3º Popular – Mariana Caires
Antigo Soldado – Jéssica Perestrelo
Vicente – André Barros
Outros Populares – Joana Carvalho, Sofia Silva
1º Polícia – Diogo Fernandes
2º Polícia – Tiago Lemos
D. Miguel – Gonçalo Pacheco
Principal Sousa – André Aguilar
Beresford – Francisco Faria
Andrade Corvo – Diogo Bettencourt
Sousa Falcão – Miguel Ângelo Pestana
Matilde – Ivone Fernandes, Angélica Jardim, Sandrina Freitas
Olhem bem! Limpem os olhos no clarão daquela fogueira e abram as almas ao que ela nos ensina!
Até a noite foi feita para que a vísseis até ao fim…
Felizmente – felizmente há luar!
(Última fala de Matilde em Felizmente Há Luar)
Extracto de uma entrevista de Luís de Sttau Monteiro a Rogério Rodrigues do Diário de Lisboa em 06-10-1978
R. R. – Em que circunstâncias escreveste a peça?
L.S.M. – Escrevi-a em circunstâncias especiais. Correspondeu a um período em que eu tinha escondido em casa o Nikias Skapinakis. Foi um período perturbado. A peça foi posta à venda ao público, impressa em Dezembro de 1961. Eu fui preso logo a seguir, a dois ou quatro de Janeiro, não tenho a certeza… Tinha que entreter aquelas pessoas que tinha lá para que não me chateassem muito. Então resolvi escrever uma peça de teatro. Quando aparecia lia-lhes a peça que os entretinha muito e de que gostavam... E os primeiros tipos que ouviram a peça ansiosamente foram os tipos que se evidenciaram cá no burgo: O Mário Soares, o Chico Salgado Zenha…
R.R. – Que livros é que consultaste para escrever o “Felizmente Há Luar”?
L.S.M. – Sobretudo o Brandão, portanto, a “Conspiração de 1817”. Li muito cuidadosamente a única pela escrita em língua portuguesa sobre o Gomes Freire, além da minha, que é do Pinheiro Chagas… Depois tentei ler o processo de Gomes Freire, mas o processo, que estava na Torre do Tombo, desapareceu integralmente… Estive na Biblioteca Nacional e li tudo o que apareceu, …
Depois achei muita piada porque a personagem principal da peça, que é a Matilde, foi mais ou menos inventada. Não havia nada ou muito pouca coisa escrita sobre a Matilde. A primeira vez que eu vi coisas directamente ligadas à Matilde foi uma carta escrita pelo Gomes Freire mas que eu não me lembro de quem é que a tinha. Eu tenho a impressão que era da Biblioteca de Palmelas, mas não te posso jurar. Ultimamente é que apareceu uma carta nova, inédita, que está lá na exposição.
R.R. – Eu queria perguntar-te exactamente se a peça não é excessivamente datada. Quando a escreveste não estavas a pensar concretamente no caso do general Humberto Delgado que acabara de ser vítima, em 1958, de uma grande fraude eleitoral?
L.S.M. – É claro que estava. É evidente que estaria a pensar no Humberto Delgado, só que eu nessa altura não sabia como é que ia acabar o general Humberto Delgado… Era um gajo espantosamente popular, era adorado pelo povo de tal forma que quando o Gomes Freire é enforcado lá em baixo em S. Julião da Barra, mandam os soldados virar as costas tal o medo que tinham de que os soldados, ao verem o Gomes Freire caminhar para a forca, se revoltassem. Estás a ver a popularidade deste gajo… O Povo tinha uma consciência de classe? É evidente que em 1817 não tinha. É evidente que o Gomes Freire de Andrade representa o espírito da Revolução de 1820. Portanto é a revolução, se quiseres, de uma burguesia comercial lixada com o acordo do Brasil, mas sobretudo é a revolução de uma burguesia que já não se satisfaz com a posição nobiliárquica adquirida pela burguesia promovida a nobreza em 1395 pelo Mestre de Avis. Mas que o povo existia, existia… e o Povo seguia a classe mais revolucionária da época que era a burguesia.
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