terça-feira, 4 de maio de 2010

Felizmente Há Luar





Sinopse
A peça Felizmente Há Luar, de Luís de Sttau Monteiro (1926 – 1993) é um drama narrativo de carácter épico, que se baseia na tentativa frustrada de revolta liberal em 1817, supostamente encabeçada por Gomes Freire de Andrade. Após a Revolução francesa de 1789 e as invasões napoleónicas, Portugal fica indeciso entre os aliados e os franceses. Para evitar render-se, D. João V foge para o Brasil. Entretanto, após a 1ª invasão napoleónica, a corte portuguesa pede a Inglaterra um oficial para reorganizar o exército: o General Beresford.
Em dois actos, são recriados os acontecimentos históricos que em Outubro de 1817 levaram à prisão e ao enforcamento de Gomes Freire pelo regime de Beresford, com o apoio da Igreja. São apresentadas as condições da sociedade portuguesa do Século XIX e a revolta dos mais esclarecidos, muitas vezes organizados em sociedades secretas.
A peça segue a linha de Brecht e mostra o mundo e o homem em constante transformação; mostra a preocupação com o homem e o seu destino, a luta contra a miséria e a alienação e a denúncia da ausência de moral; alerta para a necessidade de uma sociedade solidária que permita a verdadeira realização do homem.
Este texto é também uma metáfora política pois, apesar de a acção estar relacionada com um facto preciso e histórico, o seu principal objectivo seria retratar a situação de Portugal durante o Estado Novo. Nele vê-se a ditadura de Salazar e a perseguição do seu mais visível opositor, o General Humberto Delgado.
Felizmente Há Luar não foi oficialmente proibida pela censura, mas foi retirada das livrarias e a sua representação não foi permitida até 1974. A peça foi levada à cena pela primeira vez em Paris em 1969. Só em 1978 foi apresentada em Portugal, no Teatro Nacional, numa encenação do próprio Sttau Monteiro.
Referências:
Jacinto C.; Lança G.; Análise da Obra Felizmente Há Luar, Porto, Porto Editora, 2007








Ficha Técnica
Texto: Felizmente Há Luar de Luís de Sttau Monteiro
(Adaptação do Grupo de Teatro O Moniz – Carlos Varela)
Encenação: Grupo de Teatro O Moniz – Carlos Varela
Cenografia: Grupo de Teatro O Moniz – Carlos Varela (Mestre Ramiro)
Figurinos: Grupo de Teatro O Moniz – Carlos Varela
(Alguns figurinos do Teatro Experimental do Funchal – TEF)
Adereços: Grupo de Teatro O Moniz – Carlos Varela
Caracterização: Carolina Camacho
Coordenação: Fernanda Freitas
Personagens/Actores
Manuel – Francisco Faria
Rita – Diana Caires
1º Popular – Sara Gouveia
2º Popular – Neide Aguiar
3º Popular – Mariana Caires
Antigo Soldado – Jéssica Perestrelo
Vicente – André Barros
Outros Populares – Joana Carvalho, Sofia Silva
1º Polícia – Diogo Fernandes
2º Polícia – Tiago Lemos
D. Miguel – Gonçalo Pacheco
Principal Sousa – André Aguilar
Beresford – Francisco Faria
Andrade Corvo – Diogo Bettencourt
Sousa Falcão – Miguel Ângelo Pestana
Matilde – Ivone Fernandes, Angélica Jardim, Sandrina Freitas
Olhem bem! Limpem os olhos no clarão daquela fogueira e abram as almas ao que ela nos ensina!
Até a noite foi feita para que a vísseis até ao fim…
Felizmente – felizmente há luar!
(Última fala de Matilde em Felizmente Há Luar)
Agradecimentos: Conselho Executivo da Escola Secundária Jaime Moniz, Direcção Regional da Educação, Direcção Regional de Juventude, Teatro Experimental do Funchal, António Freitas, Carla Rodrigues, Fátima Marques, José António Gouveia, José Paulo Camacho, Marco Aguiar, Ramiro de Gouveia, Susana Rodrigues, e a todos aqueles que, directa ou indirectamente contribuíram com o seu esforço e dedicação para a concretização deste evento.



Extracto de uma entrevista de Luís de Sttau Monteiro a Rogério Rodrigues do Diário de Lisboa em 06-10-1978

R. R. – Em que circunstâncias escreveste a peça?
L.S.M. – Escrevi-a em circunstâncias especiais. Correspondeu a um período em que eu tinha escondido em casa o Nikias Skapinakis. Foi um período perturbado. A peça foi posta à venda ao público, impressa em Dezembro de 1961. Eu fui preso logo a seguir, a dois ou quatro de Janeiro, não tenho a certeza… Tinha que entreter aquelas pessoas que tinha lá para que não me chateassem muito. Então resolvi escrever uma peça de teatro. Quando aparecia lia-lhes a peça que os entretinha muito e de que gostavam... E os primeiros tipos que ouviram a peça ansiosamente foram os tipos que se evidenciaram cá no burgo: O Mário Soares, o Chico Salgado Zenha…
R.R. – Que livros é que consultaste para escrever o “Felizmente Há Luar”?
L.S.M. – Sobretudo o Brandão, portanto, a “Conspiração de 1817”. Li muito cuidadosamente a única pela escrita em língua portuguesa sobre o Gomes Freire, além da minha, que é do Pinheiro Chagas… Depois tentei ler o processo de Gomes Freire, mas o processo, que estava na Torre do Tombo, desapareceu integralmente… Estive na Biblioteca Nacional e li tudo o que apareceu, …
Depois achei muita piada porque a personagem principal da peça, que é a Matilde, foi mais ou menos inventada. Não havia nada ou muito pouca coisa escrita sobre a Matilde. A primeira vez que eu vi coisas directamente ligadas à Matilde foi uma carta escrita pelo Gomes Freire mas que eu não me lembro de quem é que a tinha. Eu tenho a impressão que era da Biblioteca de Palmelas, mas não te posso jurar. Ultimamente é que apareceu uma carta nova, inédita, que está lá na exposição.
R.R. – Eu queria perguntar-te exactamente se a peça não é excessivamente datada. Quando a escreveste não estavas a pensar concretamente no caso do general Humberto Delgado que acabara de ser vítima, em 1958, de uma grande fraude eleitoral?
L.S.M. – É claro que estava. É evidente que estaria a pensar no Humberto Delgado, só que eu nessa altura não sabia como é que ia acabar o general Humberto Delgado… Era um gajo espantosamente popular, era adorado pelo povo de tal forma que quando o Gomes Freire é enforcado lá em baixo em S. Julião da Barra, mandam os soldados virar as costas tal o medo que tinham de que os soldados, ao verem o Gomes Freire caminhar para a forca, se revoltassem. Estás a ver a popularidade deste gajo… O Povo tinha uma consciência de classe? É evidente que em 1817 não tinha. É evidente que o Gomes Freire de Andrade representa o espírito da Revolução de 1820. Portanto é a revolução, se quiseres, de uma burguesia comercial lixada com o acordo do Brasil, mas sobretudo é a revolução de uma burguesia que já não se satisfaz com a posição nobiliárquica adquirida pela burguesia promovida a nobreza em 1395 pelo Mestre de Avis. Mas que o povo existia, existia… e o Povo seguia a classe mais revolucionária da época que era a burguesia.

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